No limiar da realidade

 

 

Num meio de comunicação em constante decadência, como é o caso da televisão, são muito raras as ocasiões em que somos tomados de surpresa por alguém que conseguiu que a sua arte fosse emitida através de ondas hertzianas, ao invés do seu mero contributo para a estabilidade económica de uma estação.

 

Muito antes de sermos "violados" por programas culturais como o Big Brother ou por continuas reciclagens de ficheiros já pouco secretos, um senhor que dá pelo nome de Rod Serling imaginou uma serie onde o fantástico teria todas as portas abertas... uma dimensão de visão, uma dimensão de som, uma dimensão de mente...

 

Decorria o ano de 1959, os parâmetros sobre os quais as cadeias de televisão nos Estados Unidos da América funcionavam em pouco diferiam das que actualmente monopolizam 99% dos canais de todo o mundo. Rod Serling era já um autor sobejamente conhecido e premiado com vários emmy (os oscares da tv). Com uma força criativa fora do comum, Serling já tinha escrito inúmeros programas entre os quais figurava "PATTERNS", um pilar da idade de ouro e da tv em directo.

 

Estava na altura de fazer algo de novo, a pressão era grande, e toda a gente esperava que cada novo argumento fosse um êxito... havia no entanto uma reticência da CBS; todo e qualquer tipo de material relacionado com o fantástico estava completamente fora de questão... A ironia do destino veio neste caso dar a sua "colher de chá". O próximo projecto de Serling consistia numa serie de episódios de 25 minutos dedicados a historias fantásticas e dava pelo nome de THE TWILIGHT ZONE (versões traduzidas em Português e já transmitidas pela RTP e mais recentemente pela RTP2 : A QUINTA DIMENSÂO - NO LIMIAR DA REALIDADE).

 

Não nos podemos esquecer, que nos encontrávamos nos EUA e que o contexto sócio cultural não era o melhor para que um autor pudesse dar asas á sua imaginação. Rod Serling sabia isto melhor que ninguém, visto já ter sido por varias vezes alvo da impiedosa censura que sem qualquer tipo de problemas mutilara alguns dos seus trabalhos. Serling tinha que fazer uma jogada inteligente... e fê-la.

 

O episódio piloto chamava-se "Where Is Everybody?" e rodava a volta de um personagem que acordava numa cidade onde não conseguia encontrar ninguém, mas frequentemente se deparava com sinais indicadores da presença de seres humanos (charutos acesos, torneiras a correr...). No final podíamos constatar que o personagem central estava a ser alvo de uma experiência do exercito americano a fim de testar a capacidade de isolamento que o homem era capaz de suportar no espaço... o autor tinha tocado no ponto certo.

 

Ainda um pouco reticente a CBS comprou a serie e qual não foi a sua surpresa quando começaram a receber os episódios que tinham comprado... desde viagens temporais, fantasmas até extra terrestres não havia limites para onde a imaginação fluía... A estação reclamou, mas graças ao profissionalismo do produtor Buck Hougton, Serling consegui levar o seu projecto avante...

 

O que fazia e ainda faz da TWILIGHT ZONE um caso impar quando se fala de fantástico é o facto do seu autor ter uma sensibilidade literária apurada. A imaginação providenciava as metáforas de que Serling necessitava para dizer coisas que ninguém ousava dizer e que de outra forma o teriam levado ao repudio publico e certamente ao desemprego. Todas as histórias eram tecidas com um fio simples, que tanto miúdos como graúdos eram capazes de absorver... o "truque" estava nas diferentes camadas de informação que os episódios continham, capazes de jogar com a percepção de cada espectador. Todo o material apresentado continha uma forte componente humana, apontada maioritariamente para a introspecção e problemas sociais iminentes (que na altura eram completamente proibidos). Alguns dos assuntos mais queridos de Serling prendiam-se com o racismo /xenofobia (imaginem o que era um autor falar disto nos 50´s e ainda para mais nos EUA!), a idade e as suas consequências e o isolamento.

 

O facto de toda a serie ser a preto e branco contribuía para a carga dramática dos episódios, transformando-os em muitos casos em pequenos film noir.

 

Os mais cépticos viram as suas contestações caírem por terra. THE TWILIGHT ZONE é talvez o mais importante programa de ficção alguma vez feito em televisão. O sucesso não foi momentâneo, tendo-se prolongado ate hoje. Para além de 5 épocas no ar (1959-1964) e de todos os prémios que recebeu, a série atingiu um estatuto de culto um pouco por todo o mundo, sendo ainda hoje alvo de constantes reposições e edições vídeo e dvd.

 

Nos anos 80 uma equipa revitalizou a mística da THE TWILIGHT ZONE e produziu a serie THE NEW TWILIGHT ZONE (já emitida em Portugal e actualmente transmitida pelo sci fi channel), desta feita os episódios eram de 1 hora, a cores e a produção envolvida era bastante maior do que a da serie original. Fez-se ainda, também no inicio dos anos 80 a película TWILIGHT ZONE - THE MOVIE na qual realizadores de renome revitalizaram quatro histórias clássicas e transportaram-nas para o grande ecrã.

 

O culto continua até hoje, mas o homem que provou que da televisão podiam nascer sonhos partiu em 1975 com 50 anos. Na bagagem levou porém uma passagem preenchida e a certeza da sua obra realizada. Podemos encontrá-lo sempre que quisermos num zapping, no momento em que uma fita entra no vídeo, no momento em que o laser incide sobre o disco... o homem de aspecto frágil, que gostava de se apresentar sempre com o seu cigarro e que queria ser recordado como um escritor... o homem que nos abriu as portas da imaginação e que é o nosso guia... na quinta dimensão.

 

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